sábado, 27 de janeiro de 2018

Funk: o fetichismo incentivado




         "Certo grau de fetichismo, portanto, está habitualmente presente no amor normal, especialmente naqueles seus estágios em que o objetivo sexual normal parece inatingível ou sua consumação é impedida". Freud - Três ensaios sobre a teoria da sexualidade.
    
    
    
    
    
 Podemos dizer que o fetiche é algo que é colocado no lugar do objeto “natural” de desejo sexual. Algo, uma parcela do que vê, faz com que a pessoa se sinta excitada. Pode ser um objeto, como um sapato feminino de saltos altos, ou pode ser parte do corpo de uma pessoa (o tórax malhado, por exemplo). Depreende-se que todos nós somos um tanto fetichistas. Ninguém escolhe seu fetiche, pois sua origem é inconsciente. Sem problemas!
    

    
  O fetiche não é nem bom nem mau. Só será um mau quando causar infelicidade, dor psíquica ou sofrimento. Fora disso, apenas podemos dizer que é um fato da sexualidade humana, portanto, algo amoral (atentem para o “a” antes da “moral”. Não é um “i”.)
    
      Mas, passa a ter um componente preocupante quando um fetiche é conscientemente incentivado. Quando as mídias intencionalmente treinam o olhar e o desejo para fragmentar a pessoa. Uma mulher (ou homem) é sensual no seu contexto. O olho, o braço, a perna, a cintura, tomados por si só, nada significam. A sensualidade não está aqui ou ali. Está no conjunto. O homem ou a mulher, são sensuais no seu todo corporal.
    
      Quando as músicas e as coreografias ensaiadas, notadamente no funk, celebram e focalizam a bunda feminina, têm a intenção de criar um fetiche.
     
Olha a explosão
Quando ela bate com a bunda no chão
Quando ela mexe com a bunda no chão
Quando ela joga com a bunda no chão
Quando ela sarra e o bumbum no chão chão
                    (Olha a explosão – Mc Kevinho)

        Fico impressionado com as celeumas artificiais incentivadas.  Percebo isso quando é dito que a artista tal é corajosa porque mostra a bunda com celulite, e isso repercute! Mesmo sem ter relevância alguma.  Pior fica quando alguém defende que a mulher tem o direito de mostrar o que quiser e, na sequência, defende o empoderamento feminino ao mostrar a bunda. A defesa do direito de “mostrar o quiser” e da tese do “empoderamento”, só se torna visível (relevante) quando a bunda é focada. As bundas portam uma mulher!
    
      Então as clínicas vendem tratamentos para as bundas (não para as mulheres). As músicas se submetem a terem letras que valorizem o culto às bundas. As cantoras passam a terem bundas magníficas. Bundas vendem bem. E como tudo que vende, o mercado tende a empurrar o consumo, manter o desejo, estimular a procura. Se a bunda tiver uma boa voz e talento, melhor, mas não necessariamente.
    
    
      A questão não é a bunda em especial, mas o fetiche que é imposto. A questão não é a mulher de nádegas lindas. Não! A questão é a intenção de fixar a sexualidade num ponto do corpo feminino. O problema é sobrepor a parte ao todo. Quero dizer, a sensualidade está no conjunto da mulher! Ela toda é sensual, não pode ser fragmentada. Impor, vender e comprar um fetiche conscientemente, merece ser questionado.
    
      Para que não aja dúvidas quanto a intenção de ensinar o fetiche bunda, as letras medíocres das músicas indicam para onde deve o olhar se fixar. As letras dizem o que (no corpo) valorar sexualmente. O olhar tem que ser direcionado. Sem esquecer as expressões faciais do cantor. Geralmente, expressam direção, fixação e desejo sexual (nunca amoroso). As bailarinas e as cantoras movimentam seus quadris, sempre num sentido vertical (sobe e desce) rítmico, oscilante. Sempre mais do mesmo.
    
      E quando os (as) compradores (as) de glúteos (os consumidores de músicas e de fetiches impostos) se cansam, vem algo novo, sempre mais provocativo. Vale tudo para manter a fixação.
    
      As gravadoras e as indústrias de cervejas, agradecem.
    
    
    
    


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