domingo, 28 de dezembro de 2014

Os sofistas e sua sabedoria


Os Sofistas eram sábios. Eram especialistas em determinadas áreas do saber e, com certeza, especialistas na retórica. Portanto, não eram tidos como filósofos, mas como pessoas escreviam bem e ensinavam. Eram percebidos como quem tinha muito conhecimento a transmitir.
Eram muito procurados e faziam “sucesso” entre os jovens. Cobravam por seus ensinamentos e não procuravam a verdade. Por isso, a palavra "sofista" começou a ser utilizada em sentido depreciativo. A palavra passa então a ser utilizada no sentido de charlatão ou mentiroso.
Sócrates foi um dos principais responsáveis pela má fama dos sofistas. Apesar disso foi muitas vezes confundido com eles. Ao contrário dos sofistas, Sócrates dispensava gratuitamente o seu saber a quem dele necessitava - achava vergonhoso vender o saber na praça publica. Sócrates os via como mercadores, que elogiam os produtos que vendem mesmo sem saberem se são bons ou não e que adequavam seu produto ao gosto dos compradores.
Como era hábito, e Sócrates usava o mesmo local,  os sofistas ensinavam em locais públicos mais frequentados. Algumas vezes nas casas particulares dos que os podiam acolher. Eram viajantes de cidade em cidade.
 Os sofistas aprendiam tudo o que podiam em suas andanças, notadamente interpretava os poemas de Homero.
Na democracia ateniense todo o cidadão era chamado a participar da vida política, a ir a Àgora defender o interesse da polis. Isso justifica a importância que assumem os sofistas. Eles oferecem – recendo por isso -  o ensino da virtude e técnica. 
        Os Sofistas vieram suprir a necessidade de fazer política naquele contexto histórico.             Antes deles não havia quem ensinasse a retórica, a arte dos argumentos 

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

O trabalho no capitalismo

Prof. Amilcar Bernardi

O capitalismo possui algumas características que o diferenciam dos demais sistemas econômicos.  Uma das características se  refere a produção de mercadorias. Aqui podemos ressaltar que os produtores não têm interesse imediato no valor de uso do que foi produzido, mas sim, em seu valor de troca.  Este valor (para as trocas) não tem limites. Ele vale o tanto que as pessoas desejam que ele valha. 
 
Dizemos valor de troca por que o dinheiro arrecadado com a venda de um produto é desejável porque pode ser trocado por outros produtos (na medida do tanto que os desejo). 
 
No capitalismo, portanto, produzimos não porque precisamos diretamente do que foi produzido, mas produzimos em vista de outros produtos que desejamos. Dessa forma, até o trabalho humano torna-se mercadoria (vendo meu trabalho para obter produtos). Tudo se volta para a produção não como um fim em si mesmo, mas para trocas. Inclusive, na sociedade capitalista, somos obrigados a travar relações com pessoas que não conhecemos, para que possamos vender nossa mercadoria-trabalho ou para fazermos trocas impessoais.  O que nos liga às pessoas estranhas neste caso? Meu valor de trabalho como mercadoria ou o tanto que prometo trocar mercadorias com elas.
 
Mercadorias se comunicando com mercadorias. 
 
Ora, para que vendamos nosso trabalho, é preciso que os meios de produção não sejam nossos; e que quem os possua compre (da forma mais barata possível) nossa capacidade de trabalho. Sem a propriedade privada dos meios de produção não pode haver essa relação. O capitalismo, portanto, precisa que alguns poucos tenham a propriedade dos meios, e outros tantos tenham apenas a capacidade de trabalho. 
 
Todos não podem usufruir igualmente da propriedade. 
 
A partir daí, os proprietários não precisam mais descer ao chão das fábricas. É suficiente gerenciar o que lhes pertence. Esse gerenciamento faz com que o excedente produzido pelo trabalho alheio seja apropriado pelo capitalista de forma crescente. 
 
A partir da Revolução Industrial os trabalhadores não tiveram mais controle algum sobre o produto do seu trabalho nem sobre os meios de produção.
 
 
Outro elemento importante nos primórdios do capitalismo, é a ideia de que o trabalho comprado do trabalhador tem que valer a pena, ou seja, aquilo que o trabalho produz gere excedente ao empregador (e quanto mais, melhor). O salário do trabalhador não pode consumir o valor do que ele produz. Então, para que haja excedente, a maioria das pessoas vivem com salários insuficientes para seu próprio sustento. 
 
 Para o capitalismo radical, não é interessante que todos estejam empregados.
 
No capitalismo sempre houve o fenômeno do desemprego. Quanto maior a oferta de trabalhadores, menor a remuneração. É a lei da oferta e da procura. Além de manter uma grande oferta de pessoas, o medo faz com que o trabalhador tenda a aumentar sua jornada de trabalho na tentativa de receber um pouco mais ou de se manter na empresa. A pessoa perde a autonomia, não mais é dona de si mesma. 
 
Com a novidade do trabalho em casa (teletrabalho) e da tecnologia robótica, além da ameaça de redução dos direitos trabalhistas, a realidade tende a ser a drástica redução da liberdade de escolher a hora de trabalho, da capacidade de negociar salários e do ritmo da produção.
 
Lembrando que nem falamos do capital especulativo que não gera vagas no mercado de trabalho. 

Se o trabalhador é mera mercadoria, poderá estar com seus dias contados.

Mas, ele é mesmo só uma mera mercadoria? Sem o trabalhador bem remunerado, haverá trocas de mercadorias? Sem consumidores, haverá o capitalismo?
 
Fica a reflexão.
 
 



sábado, 6 de dezembro de 2014

O poder segundo Aristóteles


Pioneiro em várias áreas do conhecimento, o pensador grego não ficou apenas filosofando sobre qual seria a forma ideal de governo: pesquisou muito até achar o regime que, na prática, funcionava melhor
Muita gente tem tanta aversão a política que, ao ler essa palavra, vai pular correndo para a próxima matéria. Atualmente, essa atividade está tão comprometida por seus profissionais que não há como não dar um pouco de razão a quem sofre dessa alergia. Como tantas outras palavras correlatas (“monarquia”, “tirania”, “oligarquia” e “democracia”), o termo “política” foi criado na Grécia antiga. E, já naquela época, a desilusão com os políticos era grande. Por isso, os gregos fizeram questão de tentar entender como um negócio cujo principal objetivo é alcançar o bem coletivo pode dar tão errado.
Um dos mais importantes filósofos gregos a encarar essa tarefa foi Aristóteles, que viveu entre 384 e 322 a.C. Discípulo de Platão, foi um protótipo do pensador enciclopédico. Nada escapou de sua curiosidade e indagação. Ele frequentou praticamente todos os ramos do que hoje convencionamos chamar de “saber” (e até fundou alguns deles): da vida dos animais à astronomia, do modo correto de produzir e de organizar as ideias até os segredos da eficácia de uma peça de teatro. Em Política, o filósofo grego ocupou-se em descrever as mais variadas formas de convivência humana sob um governo comum. Mais do que isso, ele também tenta responder a inúmeras indagações: quais formas de governo são as melhores? Por que ocorrem as revoluções? O que fazer para evitá-las? Que papel deve exercer a educação na melhoria dos cidadãos? Quais as características físicas e sociais de uma cidade ideal?
Não faltam intérpretes da obra aristotélica capazes de apontar na Política a origem de ciências como a economia, a sociologia, a antropologia e a própria ciência política. O texto é, na verdade, uma reunião de vários livros escritos pelo autor em épocas distintas (o que provoca, às vezes, inconvenientes como repetições ou incongruências entre algumas partes). Logo no primeiro capítulo, há uma definição que ainda costuma fazer o leitor pular na cadeira: “O homem é por natureza um animal político”. Mas, afinal, o que é a política para Aristóteles? Para responder a essa questão, é preciso, antes, fazer um desvio etimológico. O termo deriva da palavra grega polis, que designa cidade. Este é, na concepção grega, o lugar por excelência da convivência e felicidade humanas, onde se concentra a civilização – em contraposição ao que está fora da cidade, que é o lugar dos bárbaros.
Para Aristóteles, o ser humano só se realiza (ou, em outras palavras, só alcança sua essência) vivendo em comunidade. Mas não basta que essa comunidade garanta a mera sobrevivência e um certo conforto material – pois isso também pode ser encontrado na família ou numa aldeia. De acordo com o filósofo francês Pierre Aubenque, em A Prudência em Aristóteles, “a finalidade da cidade não se resume a ‘viver’, isto é, satisfazer as necessidades, mas também o ‘viver bem’, ou seja, a vida feliz, que, para os gregos, se confunde com a vida virtuosa”. Dotado da capacidade de fala (logos, em grego), o homem tem a capacidade de se expressar de maneira sensata e de refletir sobre seus atos. Ele é, portanto, capaz de distinguir o que é justo do injusto. “A comunidade de seres com tal sentimento” para Aristóteles é a cidade, que, segundo ele, é superior à família ou à aldeia da mesma forma que o corpo inteiro é superior ao pé ou à mão.
Na ciência política, a tradição aristotélica se contrapõe às teorias baseadas no conceito de “contrato”, como a elaborada pelo inglês Thomas Hobbes no século 17. Para ele, a obediência ao governo nasce de um pacto que visa garantir a segurança de todos. Ameaçados pela lei do mais forte, que rege a natureza, os homens decidem, num contrato coletivo, se submeter a uma instância superior. Segundo Hobbes, é esse acordo que dá origem ao Estado. Na Grécia de Aristóteles, idéias como essa já eram defendidas. Protágoras, por exemplo, via no homem um ser rebelde por natureza, que viveria na cidade apenas por interesse. É esse tipo de concepção que Aristóteles combate: para ele, a comunidade política é uma evolução natural dos agrupamentos humanos mais simples, como a família.
Segundo o método do filósofo grego, entretanto, chegar a uma definição sobre o que é a política não basta para entendê-la. É preciso percorrer, com olhar atento e minucioso, o maior número possível de situações reais. Aristóteles se dedica então a examinar e comparar as formas de governo existentes na Antiguidade. Sua sede de conhecimento fez com que ele reunisse uma impressionante coleção de constituições. Das 158 recolhidas por Aristóteles, entretanto, só uma sobreviveu até hoje: a de Atenas, encontrada em um papiro em 1890.
A obsessão investigativa de Aristóteles se justifica. Ele não queria apenas descobrir qual seria “a melhor forma de governo” – ela também tinha de ser “a melhor forma de governo possível de acordo com as circunstâncias”. Esse pragmatismo traz uma importante diferença com relação a Platão: em República, o mestre de Aristóteles buscava conceber uma forma de gestão baseada em ideais. Na Política, a filosofia desce do céu e planta seus pés na terra: o autor pretende prescrever a melhor forma de governo que pode, na prática, existir.
Baseado em sua pesquisa, Aristóteles define os três tipos de regime político: o comandado por uma única pessoa é a monarquia, o liderado por um pequeno grupo é a aristocracia e o controlado pela maioria dos cidadãos é a politia. Cada um deles tem, respectivamente, uma forma degradada: a tirania, a oligarquia e a democracia (é isso mesmo: naquela época esta palavra estava longe de ser sinônimo de bom governo – Aristóteles a utiliza mais ou menos como hoje falamos em “demagogia”). Mas qual a diferença, por exemplo, entre a monarquia e a tirania? Simples: na primeira, o líder governa buscando o bem comum e, na segunda, ele governa de acordo com seus próprios interesses. É isso que distingue, nos três casos, o bom do mau governo, o justo do injusto. Os primeiros são verdadeiramente políticos, os segundos são despóticos.
Dentre as três formas de governo, Aristóteles admite que a monarquia e a aristocracia podem ser as melhores. Mas, para que isso aconteça, é preciso que, no comando do regime, exista um homem excepcionalmente sábio e justo, no primeiro caso, ou um grupo deles, no segundo. Como essa situação é incomum, a forma mais indicada de governo é a politia: mesmo que a cidade não possa contar com uns poucos homens de valor excepcional, é razoável que ela conte com muitos capazes de governar e de ser governados, alternadamente. Para evitar abusos, a politia conta com leis escritas a ser seguidas (daí ela também ser chamada de “governo constitucional”). Ou seja: a forma preferida por Aristóteles não está assim tão longe do modelo formal de democracia que temos hoje.
O que torna o texto aristotélico um clássico não é nem sua antiguidade nem sua influência, mas sua habilidade em extrair da história casos que permitam a seus leitores entender as razões de determinadas lições. Aristóteles nos ensina que dar as costas para a política é ignorar uma boa parte do que existe de humano em nós. É como escreve Francis Wolff, especialista em filosofia antiga, no livro Aristóteles e a Política: “Assim como um povo sem memória histórica não tem verdadeiramente história, uma vez que não pode agir sobre ela, da mesma forma um povo sem a consciência de um domínio próprio das coisas da cidade não pode agir politicamente, uma vez que não sabe que a política é aquilo que lhe pertence”.

O professor do general

Nascido na Macedônia, Aristóteles foi tutor de ninguém menos que Alexandre, o Grande. Ao lado de Platão, Aristóteles é considerado o mais importante filósofo da Grécia. Mas, segundo os padrões de sua época, ele não era exatamente grego, já que nasceu na cidade de Estagira, na Macedônia – local visto pelos atenienses como um reino bárbaro. Filho de Nicômaco, um médico da corte do rei Amintas III, ele partiu ainda jovem para estudar em Atenas. Lá se tornou um dos mais destacados alunos da Academia, a escola filosófica fundada por Platão. Em 343 a.C., Aristóteles se torna tutor de Alexandre, neto de Amintas III e herdeiro do trono macedônio. Depois de oito anos de aprendizado, o aluno assume o poder e dá início a uma série de conquistas: derrota os persas, ocupa a Babilônia e estende seus domínios (e as fronteiras da Grécia, transformada em império) até a Índia. Sabe-se muito pouco, entretanto, sobre o que ele aprendeu com Aristóteles. O principal tema das lições podem ter sido os poemas de Homero, base da educação grega naquela época (talvez venha daí a obsessão do conquistador pela Ilíada e sua crença de que descenderia do herói mítico Aquiles). Enquanto Alexandre é aclamado como “o Grande”, Aristóteles retorna a Atenas, onde funda sua própria escola, o Liceu. Lá começa a impor, com sua filosofia, uma influência muito mais duradoura que a que seu pupilo alcançou com a espada. Em 323 a.C., após a morte de Alexandre, uma forte reação antimacedônica toma conta de Atenas, o que faz com que o filósofo deixe a cidade. Ao partir, ele diz que não gostaria de dar aos atenienses a chance de “cometer um novo crime contra a filosofia” (numa alusão a Sócrates, que fora condenado à morte). No exílio, morreria um ano depois, aos 63 anos.
Saiba mais
Livro
A Política, Aristóteles, Martins Fontes, 1998
Do site:

http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/poder-aristoteles- 434616.shtml?utm_source=redesabril_jovem&utm_medium=facebook&utm_campaign=redesabril_avhistoria

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Lógica Aristotélica

A lógica formal clássica estuda os processos intelectuais que são a condição do conhecimento verdadeiro. Esse conhecimento verdadeiro não é o mesmo que dizer que algo existe ou não. Por exemplo, a linguagem matemática é verdadeira, mas não existe! Inclusive muitos lógicos atuais gostariam de ver as coisas serem expressas através da linguagem da matemática. Quanto mais rigorosa for mais adequada ao pensamento científico.
A filosofia precisa da lógica para ser filosofia.
Aristóteles sabia que é mais improdutivo discutir quanto maior for o grau de inexatidão. É importante no momento criativo deixarmos a mente solta, vagando. Mas no momento em que vamos expressar o pensamento é importantíssimo atentarmos para a concatenação de argumentos que nos levou a tal ou qual conclusão. É esse encadeamento demonstrável que dará a credibilidade ao que vamos expressar. Qualquer conclusão a que chegarmos será “julgada” pela coerência na concatenação dos elementos intelectuais que formaram tal conclusão.
Todo o argumento precisa conter um juízo.  
O juízo é que estabelece uma relação determinada entre dois ou mais termos (sujeito e predicado). Quando afirmo que o professor ensina, estou relacionando o termo (conceito) professor e o termo (outro conceito) ensinar. Podemos tornar isso mais complexo ao fazermos duas afirmações: 
O (todo) professor ensina. O Amilcar é professor. Logo, posso inferir que o Amilcar ensina. A inferência aconteceu quando passei das premissas a uma conclusão permitidas por elas.
Aristóteles dizia que o raciocino é válido, formalmente, quando seguimos corretamente as regras da lógica.  As regras se materializam através dos silogismos. O silogismo é o encadeamento de duas premissas. A premissa é cada uma das proposições de um silogismo que serve de base à conclusão.


Todo o pensamento deverá ser submetido a três regras básicas:
a)             Princípio da identidade. A é A. Um ser é igual a ele mesmo sempre.
b)            Princípio da não-contradição. Ou é ou não é. Sob o mesmo ponto de vista algo não pode ser e não ser.
c)             Princípio do terceiro excluído:   
     A é X – uma possibilidade
                A não é X – segunda e última possibilidade.   Exclui-se uma terceira.

Pensando dessa forma, Aristóteles criou uma nova ciência: a lógica. A inteligência grega clássica era indisciplinada e caótica (talvez hoje seja pior!) até que as fórmulas aristotélicas proporcionaram um método rápido para o teste e a correção do pensamento. A lógica significa a arte e o método do pensamento correto. É uma ciência porque, numa proporção muitíssimo elevada, os processos de pensamento correto podem ser reduzidos a regras como a física e a geometria, e ensinados a qualquer inteligência anormal; é uma arte, porque pela prática, dá ao pensamento aquela precisão inconsciente e imediata que guia os dedos do pianista.
Antes de falarmos: definamos os temos! Quanta discussão reduzida a nada! 

Outra questão importante é os universais. Um universal para Aristóteles é qualquer substantivo comum (o que denota os seres de uma espécie em sua totalidade), qualquer nome capaz de uma aplicação universal; assim, animal, homem, livro, árvore são universais. Mas esses universais são idéias subjetivas, não tangíveis. Tudo que existe fora de nós é um mundo de objetos individuais e específicos, não de coisas genéricas e universais. Ora, o homem universal não existe, exceto em pensamento, é uma abstração mental prática.
Uma contribuição admirável de Aristóteles é a doutrina do silogismo. Um silogismo é um trio de proposições das quais a terceira (a conclusão) segue-se da verdade admitida das outras duas.

Silogismo: Dedução formal tal que, postas duas proposições, chamadas premissas, delas, por inferência, se tira uma terceira, chamada conclusão.
Premissas: Cada uma das proposições de um silogismo que serve de base à conclusão.

Parece, porem, que o silogismo não é tanto um mecanismo para a descoberta da verdade quanto para a clareza de exposição e de pensamento.
Mas é importante lembrarmos que Aristóteles dizia que há um limite para o alcance da inteligência. Somente o ser dos dados sensíveis é conhecido como objeto próprio e adequado da inteligência. Aquilo que vem à nossa cabeça, a idéia alcançada pelos sentidos, é construída por semelhança, por analogia. As idéias não são atingidas diretamente.

Aristóteles utiliza as quatro formas lógicas:


TODO O X É Y.
NENHUM X É Y.
ALGUM X É Y.
ALGUM X NÃO É Y.






sábado, 4 de outubro de 2014

Maquiavel, Robbes, Locke, Rousseau



Maquiavel

Maquiavel (1469 – 1527) é autor de uma pequena obra, chamada O Príncipe.
Pensava ele que o saber político tem força descomunal fazendo com que a ação humana não seguisse um curso determinado (determinismo) pelo destino. Para Maquiavel, a fortuna (acontecimento fortuito; casualidade, acaso) proporciona chaves para o sucesso da ação política e constituía metade da vida que não pode ser governada pelo governante. O estadista sábio e prudente busca na história uma situação semelhante e exemplar, da qual saberia extrair o conhecimento dos meios para a ação e previsão dos efeitos. Para ser eficaz, a iniciativa política deve ajustar-se às circunstâncias. O necessário é manter-se à frente dos acontecimentos, procurando imprimir-lhes rumo e alternativas, dado que a fortuna é um rio impetuoso e os homens devem prevenir-se com a edificação de diques e barragens.
Para Maquiavel, o essencial numa nação é que os conflitos originados em seu interior sejam controlados e regulados pelo Estado. O povo é matéria que aguarda sua forma e a engenharia da ordem parte da análise da situação social, não resultando do arbítrio do fundador de Estados, mas de sua capacidade de captar, num momento de gênio, aquela forma desejável e de sua disposição para impô-la sem qualquer vacilação.
Os Príncipes precisam observar a realidade evitando pensar como ela deveria ser. Os homens não tendem naturalmente para uma ordem em sociedade. Essa disciplina é trabalho para a política. A política é feita por homens que imporão a ordem na sociedade sempre ameaçada pelo caos. A sociedade é o resultado da luta de forças internas, antagônicas na maioria das vezes, e da necessidade de proteção contra outras nações. O bom Príncipe é aquele que propicia o melhor arranjo dessas forças. Os homens deixados a si mesmos sucumbem no caos, pois são volúveis e ingratos. Na verdade, não meios cem por cento eficazes na contenção da natureza egoísta do homem, por isso, a história mostra que os governos são temporários, ordem e desordem se seguem em movimentos cíclicos.

Hobbes e o Estado absoluto


Thomas Hobbes (1588 –1679), inglês da família pobre, conviveu com a nobreza, de quem recebeu apoio e condições para estudar. Defendeu ferrenhamente o poder absoluto numa época em que surgiam as ideias liberais. O absolutismo havia atingido o apogeu, mas estava em declínio em relação as ideias liberais.
Hobbes é um contratualista. Ou seja, parte da ideia de um estado de natureza do homem (antes de qualquer sociabilidade, por hipótese desfruta de todas as coisas, realiza todos os seus desejos, é dono de um poder ilimitado).  Nesse estado de natureza o homem tem direito a tudo, esse direito de natureza é chamado de jus naturale (a liberdade que cada homem possui de usar seu próprio poder, da maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza – de sua vida). Acontece que enquanto perdurar esse estado de coisas, não haverá segurança nem paz alguma. A situação dos homens deixados a si próprios é de anarquia. Os interesses egoístas predominam e o homem se torna um lobo para o outro homem (homo homini lupus).
Hobbes dirá que o homem reconhece a necessidade de renunciar a seu direito a todas as coisas, contentando-se, em relação aos outros homens, a dar a mesma liberdade que dá a si mesmo. Essa nova ordem é celebrada mediante um contrato (hipotético), um pacto pelo qual todos abdicam de sua vontade em favor de um homem ou assembleia de homens, como representante de todos.  O homem não sendo sociável por natureza, o será por artifício. ‘É o medo e o desejo de paz que o levam a fundar um estado social e a autoridade política, abdicando dos seus direitos em favor do soberano.
O poder do soberano deve ser absoluto, isto é, ilimitado. A transmissão do poder dos indivíduos ao soberano deve ser total, caso contrário, um pouco que seja conservado da liberdade natural do homem, instaura-se de novo a guerra. E se não há limites para a ação do governante, não é sequer possível ao súdito julgar se o soberano é justo ou injusto, tirano ou não, pois é contraditório dizer que o governante abusa do poder: não há abuso quando o poder é ilimitado. O Estado uma vez instituído não pode ser contestado (seja monarquia ou aristocracia).
Hobbes usa a figura bíblica do leviatã, animal monstruoso e cruel, mas que de certa forma defende os peixes menores de serem engolidos pelos mais fortes.

John Locke

Também se mantém na linha do empirismo. Nasceu em Wrington, em 1632. Estudou na Universidade de Oxford filosofia, ciências naturais e medicina.   Faleceu em 1704.
          Quanto a política, Locke deriva a lei civil da lei natural, racional, moral, em virtude da qual todos os homens – como seres racionais – são livres, tem igual direito a vida e a propriedade; e, entretanto na vida política, não podem renunciar a estes direitos, sem renunciar à própria dignidade e natureza humana. Locke admite um originário estado de natureza antes do estado civilizado. Não, porém, no Esse estado de natureza de Locke é em um sentido moral, em virtude do qual cada um sente o dever racional de respeitar nos outros a mesma personalidade que nele se encontra. sentido brutal e egoísta de inimizade universal, como dizia Hobbes. O homem passa do estado de natureza ao estado civilizado, porquanto, no primeiro, falta a certeza e a regularidade da defesa e da punição, que existe no segundo, graças à autoridade superior. Entretanto, no contrato social os indivíduos não renunciam a todos os direitos, porquanto os diretos são inalienáveis. Renunciam unicamente ao direito de defesa e de fazer justiça, para conseguir que os direitos inalienáveis sejam melhor garantidos.
Locke parte da concepção individualista, pela qual os homens isolados no estado de natureza se uniram mediante contrato social para constituir a sociedade civil. Portanto apenas o pacto torna legítimo o poder do Estado. O problema está em que, no estado natural, cada um é juiz em causa própria; portanto os riscos das paixões e da parcialidade são muito grandes e podem desestabilizar as relações entre os homens.   Por isso, visando a segurança e a tranquilidade necessárias ao gozo da propriedade, as pessoas consentem em instituir o corpo político.
O ponto crucial do pensamento de Locke é que os direitos naturais dos homens não desaparecem em consequência desse consentimento, mas subsistem para limitar o poder do soberano, justificando, em última instância, o direito à insurreição. O poder é um truste, um depósito confiado aos governantes – trata-se de uma relação de confiança -, e, se, estes não visarem ao bem público, é permitido aos governados retira-lo e confia-lo a outrem.
A sociedade civil (ou política) representa um aspecto progressista do pensamento liberal. Destaca a origem democrática, parlamentar do poder político. Ou seja, o poder está fundamentado nas instituições políticas, e não no arbítrio dos indivíduos.
 Tanto para Hobbes quanto para Locke, a essência humana é ser livre da dependência das vontades alheias, e a liberdade existe como exercício de posse.  Assim, a primeira coisa que o homem possui é o seu corpo; todo homem é proprietário de si mesmo e de suas capacidades.

Jean-Jaques Rousseau

Rousseau nasceu em Genebra, a 28 de junho de 1712, morre em 02 de julho de 1778, mas na França é que produz suas grandes obras.  Tem em seus escritos um tema dominante: a relação entre a natureza e a sociedade, a moral fundada na liberdade, primazia dos sentimentos sobre a razão, a teoria da bondade natural do homem e a doutrina do contrato social. Espantoso para a época foi Rousseau criticar o individualismo burguês antes que a burguesia se consolidasse no poder. Influenciou e foi influenciado pelo iluminismo. A Revolução Francesa teve influência dos escritos de Rousseau.
Ele vai dizer que a sociedade civilizada é vil, corrupta e avara. Não critica toda a sociedade, mas aquela que acorrenta o homem. Acredita que a liberdade que o selvagem desfrutava (em seu estado de natureza) era o oposto dos liames sociais que hoje nos une (uma sociedade artificial). Os homens renunciaram a seu estado de natureza através de um pacto social onde as pessoas se mantêm sob grilhões. Rousseau propõe algo diferente, o novo pacto faz com que todos se submetam a uma vontade geral; cada pessoa deve obediência apenas ao Estado. Essa obediência só é livre enquanto o Estado representar a vontade geral. Somente o povo é fonte da legitimidade do Estado. Ninguém está submetido à vontade individual, o cidadão vai obedecer somente às leis que, por sua vez, representam a vontade geral. A vontade geral não é a soma das vontades particulares. “Se, quando o povo suficientemente informado delibera, não tivessem os cidadãos nenhuma comunicação entre si, do grande número de pequenas diferenças resultaria sempre a vontade geral e a deliberação seria sempre boa”. Mas, se as pessoas se reunissem em grupos, e esses grupos crescessem tanto que sua vontade dominasse, essa vontade seria então particular. 
A civilização é vista por Rousseau como a responsável pela degradação das exigências morais da natureza humana. Essa moral humana é substituída por uma cultura intelectual. Em seu estado de natureza o homem tem tudo. Tudo o que quer é a satisfação das suas necessidades básicas: alimento, algum conforto contra as intempéries e sexo. As paixões que o movem são o querer, o desejar e o temer. A ignorância dos vícios e a tranquilidade de seu coração são condições favoráveis para o surgimento da virtude. Já a uniformidade artificial de comportamento, imposta pela sociedade às pessoas, leva-os a ignorar os deveres humanos e as necessidades naturais. Assim como a polidez e as demais regras da etiqueta podem esconder o mais vil e impiedoso egoísmo, as ciências e as artes, com todo o seu brilho exterior, frequentemente seriam somente máscaras da vaidade e do orgulho. É a civilização que provoca a desigualdade entre aos homens, portanto, a desigualdade não é algo natural.
Sua posição é, num aspecto, inovadora, na medida em que distingue os conceitos de soberano e governo, atribuindo ao povo a soberania inalienável. Ele cria a hipótese dos homens em estado de natureza, vivendo sadios, bons e felizes enquanto cuidam de sua apropria sobrevivência. Isso até o momento em que é criada a propriedade e uns passam a trabalhar para os outros, gerando escravidão e miséria. O bom selvagem é feliz até o momento em que é introduzida a desigualdade entre os homens, a diferenciação entre o rico e o pobre, o poderoso e o fraco, o senhor e o escravo e a predominância da lei do mais forte.
É necessária uma nova liberdade, a liberdade civil.
A vontade particular e individual diz respeito a interesses particulares. Estes interesses devem submeter-se ao interesse coletivo materializado no contrato social. O homem natural não tinha a consciência daquilo que possuía, nem tampouco do que possuía o semelhante. Isso parece fazer parte da ideia de que tudo era de todos. E se tudo era de todos, o egoísmo, a vaidade e a ambição eram sentimentos inexistentes. Mas não é a propriedade em si o grande problema da civilização. A questão é a ambição em querer ficar acima dos outros. Assim os homens produzem não mais para suprir suas necessidades básicas, mas para lucrar à custa dos outros.
Diz Rousseau:
O verdadeiro fundador da sociedade civil foi o primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer “isto é meu” e encontrou pessoas suficientemente simples para acreditá-lo.
Os contratos existentes são um falso contrato, coloca os homens sobre grilhões. Numa espécie de dever ser, um ideal, Rousseau diz que o contrato social para ser legítimo deve se originar do consentimento necessariamente unânime e voluntário. Cada associado se aliena totalmente, ou seja, abdica sem reserva de todos os seus direitos em favor da comunidade.


sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Voto do caso da hemotransfusão


O senhor ministro Amilcar Campos Bernardi vota sobre o seguinte caso: Denise Konishi é testemunha de Jeová, sofre de leucemia e para sua sobrevivência necessita impreterivelmente de transfusão de sangue. Sua crença proíbe hemotransfusão, levando Denise a recusar tratamento médico. O Código de Ética Médica prevê que, nos casos em que a vida do paciente corre perigo, o médico é obrigado a fazer tudo que está ao seu alcance para salvá-la. Denise entrou com pedido alegando que a transfusão de sangue é procedimento incompatível com suas convicções religiosas e viola frontalmente a dignidade da pessoa humana e a liberdade de escolher a que tratamento deva ser submetida.
A questão é muito complexa devendo ser tratada com cuidado. Muitos direitos estão garantidos e estão por serem analisados. Muitas obrigações e omissões aparecem nessa questão. É preciso muita sobriedade evitando atropelos e ofensas às normas constitucionais e aos tratados internacionais que nosso país engajou-se.
Ao cidadão do mundo é garantida a opinião e a sua expressão. Sua fé e crenças devem ser respeitadas. A intimidade e a consciência estão protegidas do arbítrio dos estados, dos poderosos e dos intolerantes. Qualquer investida contra esses direitos merece repúdio.  Todo o ser humano é livre para pensar, desejar, aceitar ou não, tudo aquilo que caso não ofenda os direitos de outra pessoa, pense, deseje e aceite. Nada mais, nada menos que isso. Os juízos de valor e a liberdade andam juntos. Nenhum ordenamento jurídico pode atentar contra o gozo da liberdade de opinar, e nem pode contrapor-se à liberdade espiritual de pensar e de escolher.  Entretanto, para tudo há limites.
Paralelamente a liberdade de pensar e opinar, ou seja, paralelamente a liberdade de consciência, protege-se o culto religioso e a liberdade de crer. Para tanto, a Constituição Federal do Brasil de 1988, consolidou a laicidade do Estado. Por isso é impossível no nosso país o Estado contrapor-se às práticas religiosas. Igualmente não pode contrapor-se às imposições morais feitas aos seus seguidores, enquanto não infringirem as normas jurídicas. Constitui-se inclusive crime ofensas às religiões. Percebe-se que o Estado ao ser laico, não protege os ideais ateus, ao contrário, protege ateus e teístas de igual forma. Há espaço legal para todos em nossa carta magna.
Podemos resumir o que dissemos através das seguintes citações do nosso texto constitucional: a Constituição da República Federativa do Brasil prescreve que "é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias" (artigo 5º, inciso, VI, da CF). O mesmo texto disciplina que "ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei" (artigo 5º, inciso, VIII, da CF).
Percebe-se que a complexidade do tema a ser votado pode ser dirimida aos poucos. Conforme citado no parágrafo anterior, vemos que o artigo 5º da CF ratifica o direito à vida e no inciso VIII é afirmado que ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa. E um dos direitos fundamentais é - evidentemente - a vida. Então, acima de tudo, indiferente a religião que a pessoa professe este valor, a vida, prevalece sempre.
Ainda para dirimir a complexidade do tema, o Código de ética médica é claro quando estabelece os seguintes impedimentos aos médicos: Art. 54 - Fornecer meio, instrumento, substância, conhecimentos ou participar, de qualquer maneira, na execução de pena de morte e Art. 66 - Utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu responsável legal.
Mais claro ainda fica quando refletimos embasados no positivismo filosófico e jurídico.
Ao positivista cabe refletir sobre causas e consequências, sobre o que está acessível aos seus sentidos, é avesso à metafísica e às previsões infundadas. O futuro não está em 100% definido em termos de causas e consequências, ou seja, o que causamos hoje não terá perfeita linearidade com as consequências futuras. O futuro é sempre uma possibilidade, uma aposta, só isso. No caso em estudo, não cabe ao direito tentar prever as consequências psicossociais da transfusão sanguínea em “Testemunhas de Jeová”. Seria mera especulação. Porém, podemos afirmar com a linearidade da causa/efeito, em tempo tão aproximado um do outro, que sem a transfusão imediata a pessoa morrerá, conforme afirma a ciência médica. Acontecerá a morte independentemente das convicções religiosas. A questão é: ou transfunde ou morre. É isso. Também é fato que a morte assistida não existe em nosso ordenamento jurídico. Portanto, morrer sob os olhos da família, do médico e do Estado é juridicamente uma aberração. Afinal, conforme o dispositivo estabelecido no art. 122 do Código Penal, induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça, incorrerá na pena de reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Portanto, é fato que não é possível permitir ao médico não fazer a transfusão sanguínea, pois por analogia, seria um suicídio ou algo muito próximo a isso.
Inúmeros policiais militares, bombeiros e cidadãos já perderam a vida para evitar suicídios. A eutanásia e a ortotanásia ainda são proibidas no Brasil. A vida é totalmente tutelada pelo estado, a ponto deste não poder infligir a pena de morte mesmo a assassinos e a estupradores.
Concluo que aqui a decisão em tudo se afasta de uma questão religiosa. O problema é pontual: pode alguém assumir para si o risco evidente de morte em nome de algo que ainda não existe? O que não existe ainda? O futuro e a crença que ele será insuportável por uma decisão tomada hoje. E mais, não existe a certeza que o que uma pessoa crê hoje será ainda uma crença amanhã. O que é real e fatual nesse caso? A morte que poderá advir hoje, agora e sob o olhar omisso do Estado. Isso não é aceitável. Portanto, não aceito o pedido pela não transfusão de sangue. Ao contrário, afirmo sua imediata necessidade..

* Julgamento hipotético feito na Faculdade de Direito de Santa Maria



domingo, 13 de julho de 2014

Democracia e a felicidade gregas clássicas



A democracia grega clássica

Tudo que ouvimos sobre o pensamento grego clássico nos é de alguma forma familiar.
Temos a impressão que nada do que nos é relatado daquela época é novo. Isso acontece porque o pensamento ocidental é filho da Grécia clássica. Mas afinal, como ela era?
Antes do século VI a.C. os mitos explicavam, davam sentido ao universo. Além disso, os mitos tentavam esclarecer aquilo que não era imediatamente explicável. A visão mitológica cumpriu seu papel por algum tempo, mas teve que ceder espaço para outro tipo de explicação, bem mais lógica e exigente do ponto de vista dos argumentos.  O mito era mágico e baseava-se na imaginação. A Filosofia passou a utilizar essa imaginação criativa, mas a coloca sob as rédeas da razão. Era então o momento propício para que o sentido das coisas fosse dado pelo logos. Essa mudança não foi tarefa fácil. Os gregos sofreram a influência da cultura oriental onde puderam perceber os contrastes entre as idéias que predominavam na Grécia e entre outras idéias de outros povos.
A questão geográfica é relevante para entendermos porque a filosofia na Grécia desenvolveu-se. A Grécia é montanhosa fazendo com que seu litoral fosse usado para expansão em direção ao exterior. Essa expansão a colocou frente a novas culturas, economias e constituições políticas.
Foi em Atenas que a filosofia teve seu esplendor. Em Atenas as artes, a filosofia e a política estavam protegidas e cultuadas.  Sob o governo de Péricles, a capital da Grécia atingiu seu apogeu; isso no século V a.C. Nesse mesmo período o escravismo atingiu seu auge.  Alguns eram escravos por nascimento, outros obtidos pelas guerras e ainda outros se tornavam escravos por dívidas. O que tinham em comum era a ideia de que eram instrumentos de trabalho. Através da riqueza obtida pelo trabalho escravo, Atenas tornou-se o símbolo da democracia. A democracia baseava-se nos cidadãos livres. Para ser considerado cidadão a pessoa tinha que ser maior de dezoito anos, filho de pais atenienses e ser do sexo masculino. A cultura da democracia avançou tanto que foi criado inclusive um instrumento para banir temporariamente uma pessoa “nociva” a sociedade; uma espécie de plebiscito. Essa votação chamava-se ostracismo. Ele acontecia quando um cidadão era denunciado à assembleia Popular como sendo uma pessoa prejudicial à cidade. Caso fosse condenada, seria expulsa e teria seus direitos políticos cassados por até dez anos.
O que faz a polis grega ser assim tão especial? Era especial porque o centro da vida política era a praça onde se debatiam os problemas da cidade. Nessas praças também se fazia o mercado e era onde se reuniam as assembleias do povo (cidadãos). A ágora era o diferencial das cidades gregas. É na ágora que a justiça é posta em prática, onde todo o cidadão tem poder e voz.  A justiça passa a ser algo político e não mais somente moral. A palavra é o que faz a polis. O saber e a política são construídos pela reflexão dialogada. Não são os deuses que fazem a polis e sim os homens, os cidadãos.  A organização das cidades dava-se através da razão. Entenderam que se a ordem pública não tinha origem divina, os homens eram totalmente responsáveis pelas leis e pela sociedade.  Então a política assume vital importância nos debates públicos.  A figura do escravo é algo interessante: a principal característica do escravo está na ausência da fala. A escravidão estava mais na ausência da fala do que no seu direito de ir e de vir.
O que teve relevância na democracia de Atenas foi a participação direta do povo. As assembleias eram soberanas e todo o cidadão podia intervir ou propor leis Inclusive o cidadão deliberava sobre a guerra e a paz. Para que essa participação fosse possível, todo o ateniense homem deveria ser alfabetizado e dominar a aritmética. Além disso, as eleições para cargos públicos eram bem diferentes das nossas eleições atuais: era por sorteio para que todos pudessem participar. As pessoas então teriam conhecimento e experiência para poderem deliberar na ágora.
A ágora era onde aconteciam as mais variadas atividades. As pessoas podiam discutir sem medo. Desde que não infringisse as leis, tudo era permitido. Na praça havia danças religiosas, negociações para compra e venda de mercadorias além dos habituais bate papos sobre a vida política.  Inclusive era na ágora que acontecia a votação do ostracismo. Podemos dizer que a alma, a vida da cidade estava na ágora.

Somos amantes da beleza sem extravagâncias e amantes da filosofia sem indolência. Usamos a riqueza mais como uma oportunidade para agir que como um motivo de vanglória; entre nós não há vergonha na pobreza, mas a maior vergonha é não fazer o possível para evitá-la. [1]

A Grécia era constituída por diversas cidades-Estados. Estas eram independentes, cada uma delas tinha sua forma de governo, suas leis e sua moeda. Por isso eram chamadas de polis. Cada polis possuía seu sistema de governo próprio. No início a monarquia, depois as oligarquias (proprietários de terras) e por fim a democracia.  Como já foi dito, a democracia não prescindiu dos escravos. Eles desempenhavam desde funções de um trabalhador braçal até atividades administrativas. Mesmo assim juridicamente não existiam, não tinham direitos e pertenciam a alguém. Além dos motivos econômicos, os escravos eram importantes para que os cidadãos tivessem tempo para a política.  O cidadão podia então dedicar-se ao exercício da cidadania cuidando da política, além disso, podia dedicar-se a filosofia! Foi essa discussão pública que afastou as decisões da interpretação dos oráculos. As decisões passam a ser coletivas e produzidas por homens. Apalavra escrita e falada sai dos templos mágicos para ser usada pelos cidadãos. Esse é um grande avanço nas relações entre as pessoas. As relações passam a ser discutidas e reguladas através da argumentação.

Mas os órgãos que realmente mandavam eram o conselho, formados por 500 cidadãos sorteados (inclusive entre as classes pobres), e a assembleia, da qual todo cidadão (homem, filho de pai e mãe atenienses, com mais de 18 anos) era membro permanente. Até as decisões dos generais passavam por ela. O conselho preparava a legislação a ser submetida à assembleia, que era soberana para vetar a medida ou pedir modificações. Revista Aventuras na História, para viajar no tempo. Edição 68, março de 2009. Pág. 31

A democracia ateniense deu o governo ao povo. Mas quem era o povo? Eram poucos, pois excluía os escravos, estrangeiros, crianças e as mulheres. Além disso, para ser cidadão, era preciso ter nascido em Atenas. Apesar desses limites a democracia tornou-se um exemplo para as demais cidades gregas. Atenas era um centro político. O apogeu de Atenas aconteceu durante o governo de Péricles. Governou durante quinze anos (444 a 429 ªC). No comando de Péricles as assembleias populares conseguiram deter amplos poderes políticos. Foi o auge cultural de Atenas e o desenvolvimento do teatro. Ele cercou-se dos maiores pensadores do seu tempo como o escultor Fídias, o poeta trágico Sófocles, o historiador Heródoto e o filósofo Anaxágoras. Apesar disso a escravidão continuou durante seu governo.

 A felicidade: [2]


A questão moral fundamental em Aristóteles é a do bem supremo. E esse supremo bem é ainda e sempre a felicidade. A felicidade (eudemonia) consiste na realização perfeita da natureza humana. Entendemos natureza como sinônimo de essência.
Todas as ações são realizadas com o objetivo de atingir algum bem. Qual, então, o bem que seja desejado por ele mesmo?  Esse bem, embora não haja acordo sobre em que consiste, é a felicidade.  Podemos dizer que a eudemonia é uma atividade da alma de acordo com a excelência (excelência é a melhor forma de vida possível). A excelência é atingida através de uma sabedoria prática obtida pela aprendizagem.
A eudemonia é o estado de um homem no qual a natureza humana e suas plenas aspirações se realizaram plenamente e em conformidade com a verdade hierárquica dos fins dessa natureza. Quais são os fins da nossa natureza? Qual o sentido da vida?   Três coisas, principalmente, constituem a felicidade: a sabedoria, a virtude, o prazer. Pois a vida perfeita e feliz é a mais bela e a melhor das coisas e também a que produz mais alegria.  Aqui há uma ordem, uma hierarquia de importância: 1o a sabedoria que á a posse pelo espírito da verdade contemplada. A sabedoria é contemplativa, uma atividade de repouso e fruição. A contemplação vale mais que a ação. A vida perfeita é antes de tudo teórica. 2o a virtude. A vida segundo a virtude é, evidentemente, parte integrante da realização plena da natureza humana. 3o o prazer. Vem, por acréscimo, por assim dizer. Aparece como resultado necessário.  O homem não pode viver sem uma certa dose de alegria. Essa espécie de contentamento interior chamamos de prazer. É a recompensa natural de uma vida virtuosa. Essas três espécies de bens são interiores à alma. Outros bens externos são partes integrantes da felicidade: a amizade, a saúde, a posse de bens materiais.

A ética:

O homem é um ser racional. Consequentemente o seu bem ou a eudaimonia deve constituir na atuação da razão. A perfeita atuação da razão verifica-se na contemplação, logo, a felicidade consiste na contemplação. Como foi dito antes, não podemos esquecer que para ser feliz os bens materiais também são necessários, pois a contemplação pode ser perturbada por outras preocupações.
O meio para se conseguir a felicidade é a virtude. Por virtude Aristóteles entende o hábito de escolher o justo meio. Quem o estabelece é o sábio. A virtude é uma disposição para escolher; ela consiste na escolha do justo meio relativo a nossa natureza, efetuada segundo um princípio racional e fixado pelo homem prudente (ética a Nicômaco). Assim, a virtude é o hábito de praticar ações que estejam no meio entre dois excessos. Daí o dito: “In medio stat virtus”.
Aristóteles não identifica a virtude com o saber, como fizera Platão, mas dá importância também à escolha, a qual depende mais da vontade do que da razão.
Consoante sua doutrina metafísica fundamental, todo ser tende necessariamente à realização da sua natureza, à atualização plena da sua forma: e nisto está o seu fim, o seu bem, a sua felicidade, e, por consequência, a sua lei.      Visto ser a razão a essência característica do homem, realiza ele a sua natureza vivendo racionalmente e sendo disto consciente. E assim consegue ele a felicidade e a virtude, isto é, consegue a felicidade mediante a virtude, que é precisamente uma atividade conforme à razão, isto é, uma atividade que pressupõe o conhecimento racional. A característica fundamental da moral aristotélica é, portanto, o racionalismo, visto ser a virtude ação consciente segundo a razão, que exige o conhecimento absoluto, metafísico, da natureza e do universo, natureza segundo a qual o homem deve operar.
     As virtudes éticas, morais, não são mera atividade racional, como as virtudes intelectuais, teoréticas; mas implicam, por natureza, um elemento sentimental, afetivo, passional, que deve ser governado pela razão, e não pode, todavia, ser completamente resolvido na razão. A razão aristotélica governa, domina as paixões, não as aniquila e destrói, como queria o ascetismo[3] platônico. A virtude ética não é, pois, razão pura, mas uma aplicação da razão; não é unicamente ciência, mas uma ação com ciência. Aristóteles sustenta o primado do conhecimento, do intelecto, da filosofia, sobre a ação, a vontade, a política.
    A virtude também é concebida como hábito racional. Se a virtude é, fundamentalmente, uma atividade segundo a razão, mais precisamente é ela um hábito segundo a razão, um costume moral, uma disposição constante, reta, da vontade, isto é, a virtude não é inata, como não é inata a ciência; mas adquire-se mediante a ação, a prática, o exercício e, uma vez adquirida, estabiliza-se, mecaniza-se; torna-se quase uma segunda natureza e, logo, torna-se de fácil execução - como o vício.







[1] Texto de Tucídides. In: Pedro, Antônio. História da Civilização Ocidental: ensino Médio. São Palo, editora FTD, 2004,. Pág.57
[2] Maritain, Jacques. A Filosofia Moral.  Livraria Agir editora, Rio de Janeiro. 1964.
[3] Desvaloriza os aspectos corpóreos e sensíveis do homem.